Proposta altera regras de consulta popular sobre estatais
O governo de Minas Gerais encaminhou à Assembleia Legislativa (ALMG) um projeto de lei que prevê a retirada da exigência de consulta popular — plebiscito ou referendo — antes da alienação da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
Segundo trechos do texto oficial e notas divulgadas pelo Executivo, a mudança pretende dar maior agilidade jurídica aos processos de negociação com investidores e reduzir riscos de ações protelatórias que, nas palavras do Palácio, atrasariam investimentos em saneamento.
A apuração do Noticioso360 confirma a tramitação prioritária da proposta nas comissões e aponta reação imediata de partidos de oposição, sindicatos e movimentos sociais. Fontes consultadas pela redação indicam que a proposta já chegou com pedido de urgência e deve passar por, pelo menos, duas comissões temáticas antes de qualquer votação em plenário.
O que diz o governo e quais são as justificativas
Em nota, a Secretaria de Estado responsável pelo projeto argumenta que a exigência de plebiscito cria insegurança jurídica e eleva o risco de litígios que impediriam a atração de capital privado para obras de universalização do saneamento.
O Executivo afirma também que a Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário (ARASA/ARSAE-MG) terá mecanismos de acompanhamento para assegurar continuidade do serviço, cláusulas contratuais de universalização e tutela dos trabalhadores.
Prioridade legislativa e o rito nas comissões
Fontes na ALMG informaram ao Noticioso360 que o projeto tramita com prioridade nas comissões de Constituição e Justiça e de Fiscalização Financeira. Parlamentares ouvidos em caráter reservado dizem que a base aliada avalia os custos políticos da proposta, enquanto a oposição articula medidas para tentar barrar a tramitação.
O rito legislativo é decisivo aqui: há controvérsia sobre se a alteração exige lei ordinária ou emenda à Constituição estadual. Caso seja necessária emenda constitucional, o quórum exigido e os prazos aumentariam, complicando o calendário do Executivo.
Reações da oposição, sociedade civil e sindicatos
Líderes de partidos de oposição já anunciaram que vão protocolar recursos na ALMG e estudar medidas judiciais no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e, se necessário, no Supremo Tribunal Federal (STF).
Entidades sindicais que representam trabalhadores da Copasa e conselhos municipais de saneamento organizaram atos simbólicos e cobraram audiências públicas. As organizações destacam riscos sobre tarifas, manutenção do quadro de empregados e garantias contratuais para atendimento em regiões menos lucrativas.
“Qualquer projeto de desestatização precisa explicitar garantias de manutenção do atendimento, metas de universalização e princípio tarifário responsável”, afirmou a presidenta de um sindicato regional em comunicado.
Risco judicial e debate constitucional
Especialistas em direito administrativo consultados pela reportagem ressaltam que mudanças desta natureza costumam desembocar em disputas judiciais. Dois pontos concentram a divergência jurídica: se a exigência de consulta popular tem caráter constitucional na Constituição do Estado e qual o rito legislativo apropriado para a alteração.
Segundo um advogado especializado em direito público, que preferiu não se identificar, “a consulta popular é um instrumento de legitimidade para decisões sobre patrimônio público relevante”. A definição do caráter estratégico de uma empresa é, porém, sujeita a interpretação jurídica e política.
Impactos práticos e garantias técnicas
Na prática, representantes do governo apontam que contratos de venda incluirão cláusulas de manutenção de serviço, metas de investimento e fiscalização regulatória contínua pela ARASA/ARSAE-MG. Críticos respondem que a existência da agência reguladora não elimina riscos de ajustes tarifários ou redução de investimentos em áreas de menor retorno.
O Ministério Público estadual, segundo documentos obtidos pela reportagem, declarou que acompanhará o processo e poderá emitir notas técnicas e recomendações aos deputados.
Política e calendário eleitoral
Politicamente, a ofensiva do Executivo impõe custos à base do governador. Parlamentares da base admitem em privado que o tema tende a mobilizar eleitores e se transformar em pauta sensível nas eleições municipais seguintes.
A oposição calcula votos e tenta montar uma frente ampla entre partidos, movimentos sociais e conselhos municipais para barrar pontos cruciais do projeto. A estratégia inclui pedir audiências públicas e buscar maior visibilidade nas cidades afetadas pela possível transferência de controle da companhia.
O que pode acontecer nos próximos passos
O governo pediu urgência na tramitação, mas o calendário depende da atuação de lideranças partidárias e dos pareceres das comissões técnicas. Há possibilidade de emendas supressivas ou aditivas que alterem substancialmente o teor final do texto.
Se aprovado na ALMG, o projeto ainda enfrentaria, muito possivelmente, contestações no Judiciário. A diferença entre lei ordinária e emenda constitucional é central e deve ser debatida por juristas e pelo Ministério Público ao longo do processo.

